Logotipo Students Guide

O Sector visto pela ASAP

Contributo ASAP
 

Uma Radiografia das Sociedades de Advogados - 2010



Em nome da ASAP – Associação das Sociedades de Advogados de Portugal, é com enorme satisfação que aceitamos o convite da In-Lex para apresentar a realidade das sociedades de advogados Portuguesas. Esta matéria é especialmente oportuna pelo interesse que desperta nos jovens Licenciados em Direito que se preparam para abraçar a Profissão e que, por isso, necessitam de dados para analisar criticamente as suas várias modalidades.

Nessas modalidades, desponta naturalmente o exercício da Profissão sob a forma societária. Esta modalidade societária tem, no entanto uma história relativamente recente. Se é verdade que na prática já existiam casos, sobretudo em Lisboa, em que os advogados colaboravam uns com os outros, partilhando espaço e regendo-se por princípios comuns de coordenação da sua actividade, estas sociedades irregulares só se desenvolveram decisivamente em Portugal a partir de 1979. Nesse ano, através do Decreto-Lei 513º Q de 26 de Dezembro, foi publicado o primeiro regulamento das sociedades de advogados.

No seu preâmbulo estabelecia-se que “(…) a complexidade que a advocacia tem alcançado pelo desenvolvimento de diversas disciplinas vem aconselhando que o seu exercício se realize por uma colaboração entre profissionais de diversa especialização;” seguia-se uma referência - hoje já ultrapassada mas da qual se retira um pouco do espírito que presidiu a este diploma e ao reconhecimento que fez da realidade societária - “(…) por outro lado, o ingresso de Portugal em comunidades jurídicas como a CEE mais impõe esta actividade em equipa.” Saliente-se deste estatuto a consagração do objecto exclusivo das sociedades de advogados – o exercício em comum da profissão de advogado – e a aquisição de personalidade jurídica através do registo na Ordem dos Advogados. Finalmente, cumpre destacar que ao abrigo deste diploma, registaram-se 860 sociedades de advogados em Portugal durante um período de aproximadamente 15 anos.

Findo este período é publicado o regime das sociedades de advogados actualmente em vigor, nos termos do Decreto-Lei 229/2004 de 10 de Dezembro. Este diploma consagra soluções aconselhadas pela experiência anterior, das quais se destacam aquelas que promovem e consagram a institucionalização das sociedades de advogados e, sobretudo, a possibilidade de limitação da responsabilidade dos sócios (até então, pessoal, solidária e ilimitadamente responsáveis pelas obrigações da sociedade de advogados de que eram sócios). Esta possibilidade, condicionada pela existência de um seguro de responsabilidade profissional da sociedade com limites mínimos em função da facturação, constituiu um marco não só na advocacia societária mas também, por “arrastamento”, na de prática individual, pois passou a permitir-se também a estes advogados a limitação da sua responsabilidade, desde que também cobertas por um seguro de responsabilidade profissional – para uma exposição mais completa sobre o conteúdo do actual regulamento, remete-se para o claríssimo artigo do Dr. Jorge de Abreu, primeiro Presidente do Instituto das Sociedades de Advogados, responsável pelo projecto deste regulamento, chamado “O Regime Jurídico das Sociedades de Advogados”, publicado pela ASAP em Maio de 20101.

Feito o enquadramento regulamentar, falta agora radiografar, ainda que a “preto e branco”, a realidade concreta das sociedades de advogados Portuguesas. Esta análise está hoje especialmente facilitada pela recente publicação dos resultados de uma Sondagem realizada pela ASAP, em conjunto com o Centro de Sondagens da Universidade Católica (CESOP), sobre o Universo das Sociedades de Advogados. A definição deste “Universo” parte de um número que corresponde às sociedades registadas na Ordem dos Advogados (1044). Este número que surpreende pela extensão, tem que ser entendido como abarcando várias realidades – algumas delas que em parte já sucessoras de outras e, muitas delas, eventualmente já não em actividade. Se considerarmos apenas as sociedades que apresentam um contacto de endereço de email por exemplo, este número desce abruptamente para ... 813. Foi isso que fizemos, não só por imperativos técnicos do inquérito realizado, mas também por entendermos que a existência de um contacto de email revela o DNA mínimo da realidade societária que pretendemos radiografar.

A sua Representação Geográfica

Começando pelo “mapeamento” da realidade societária em Portugal, excepcionalmente partimos da realidade das 1044 registadas nesta data na Ordem dos Advogados. Dessas, 481 (46%) têm a sua sede em Lisboa, 128 (12.26%) têm-na no Porto, 26 (2,49%) nas Regiões Autónomas e 409 (39,18%) no resto do País. Se procurarmos afinar esta pesquisa pelo Universo considerado na Sondagem da ASAP (relembro, sociedades de advogados com pelo menos um endereço de email para contacto) a realidade “encolhe” para 813 e os resultados encontram-se representados no mapa seguinte:


 

Finalmente, cumpre referir que a amostra das sociedades de advogados que responderam ao inquérito é, por diversas razões, sensivelmente menor (111), sendo que essa amostra tem a seguinte representação geográfica:


 

Cumpre, no entanto, destacar o facto de 71 sociedades de advogados de Lisboa e 14 do Porto terem respondido ao inquérito o que, em nosso entender, confere acrescida legitimidade aos resultados, sobretudo quanto aos principais centros urbanos. Por essa razão, centraremos os comentários que se seguem nas sociedades de advogados do Porto e de Lisboa

Da sua Dimensão

Tomando em linha de conta não só o número de sócios mas também o número total de advogados (incluindo sócios e estagiários), resulta evidente que o perfil médio das sociedades de advogados em Lisboa e no Porto é o de uma sociedade de apenas 2 sócios (44% em Lisboa e quase 60% no Porto).


 

Nesse perfil predominam assim as sociedades de advogados com um total de até 5 advogados, incluindo estagiários (mais de 55% no Porto e quase 30% em Lisboa).





Estes são dados relevantes pois permitem aos interessados alargar o seu horizonte de pesquisa, caso optem por uma alternativa societária. Na verdade, os números demonstram que nas estruturas mais pequenas poderão estar muitas oportunidades, pois as maiores sociedades (i.e., com mais de 25 advogados incluindo estagiários) fazem claramente parte de uma realidade ainda mais restrita, correspondendo a apenas 8% em Lisboa e a cerca de 15% no Porto. Sabendo-se que nos tempos que correm as grandes sociedades reduziram o número de lugares de estagiários, pode pois aumentar o interesse pelas sociedades médias e mais pequenas (de 6 a 25 advogados), pois elas correspondem segundo esta Sondagem a mais de 55% das sociedades de advogados de Lisboa e a mais de 30% do Porto.

Da Natureza Familiar das Sociedades de Advogados e a sua Dimensão

Um dos elementos que os interessados deverão também levar em linha de conta é a extensão – à primeira vista surpreendente – da realidade das sociedades de advogados em que os sócios são total ou maioritariamente familiares. Em Lisboa (33%) e, sobretudo, no Porto (52%), esta realidade é tão evidente que nos pode levar a considerá-la não um resquício de uma situação em regressão, mas uma aposta com virtualidades estratégicas e organização próprias. Ou seja, estruturas que conseguiram adaptar-se às demais realidades e que estão claramente no mercado para ficar. Do cruzamento desta realidade com a dimensão verificamos, com alguma naturalidade, que as mesmas têm tipicamente até 5 advogados ou estagiários (47% em Lisboa e 52% no Porto), tendo maioritariamente 2 sócios (61%), quando a percentagem nacional para as sociedades não familiares com dois sócios é inferior (47%).



Do Modo de Exercício da Profissão e a Realidade Actual da Prática Societária

Para finalizar, chamamos a atenção para um resultado que transversalmente salienta o aprofundamento da realidade societária nos últimos anos em Portugal. Demonstra esta Sondagem que a “partilha de despesas” é claramente uma categoria residual na motivação da constituição de uma sociedade de advogados, tanto em Lisboa (10%), como no Porto (15%). O que explica também que (i) ao nível da utilização de bases de dados on-line (90% em Lisboa e 85% no Porto) respondam afirmativamente (ii) o software de gestão de escritórios seja uma realidade (71% em Lisboa e 50% no Porto) e, (iii) que o investimento em iniciativas de formação interna e externa seja também muito significativo (85% em Lisboa e 65% no Porto).

Diga-se, finalmente, que transversal também resultou ser a importância dada à participação em redes internacionais de sociedades de advogados, por sociedades Portuguesas que estão ainda longe de uma dimensão geralmente considerada grande. Assim, entre sociedades com 11 a 25 advogados (incluindo estagiários), 44% afirmam fazer parte de tais redes, sendo tal situação muito relevante em Lisboa (50%) e relevante no Porto (30%). A globalização também se fez sentir neste âmbito, deixando as ligações internacionais de ser uma realidade tendencialmente exclusiva das sociedades de maior dimensão.


Das Principais Preocupações das Sociedades de Advogados

Finalmente, neste último mapa procura-se representar o tipo e o nível relativo das principais preocupações que as sociedades de advogados sentem na sua actividade. É significativo que, para além da primazia recorrente (e hoje em dia eventualmente agravada) da Gestão Financeira entre as preocupações (18), se lhe sigam os Recursos Humanos (14,3), a Gestão de Expectativas de Carreiras dos Associados (11.9), a dos Sócios (10.89) e as Questões Estratégicas (10.83). Identificar estas questões como o fazem as sociedades de advogados participantes no inquérito, como prioridades, é claramente um bom indicador do foco das atenções e, da correspondente alocação de recursos que tais preocupações exigirão por parte das sociedades de advogados.


Das Boas Notícias

Todas estas informações são por isso boas notícias para os jovens Licenciados em Direito, interessados em se iniciarem na Profissão pela porta societária.

Verifica-se que esta forma de exercer a Profissão é hoje uma realidade com um grau de maturação superior, que reúne condições de trabalho, técnicas de organização e recursos tecnológicos que correspondem, e em alguns casos superam, outras actividades de prestação de serviços em áreas tradicionalmente consideradas mais sofisticadas e, por isso, mais apetrechadas.

Esta aproximação de todos estes factores abre sem dúvida o campo das possibilidades para os jovens Licenciados em Direito, interessados no exercício da Profissão em prática societária e esse é o desafio do Futuro que, no entender da ASAP, esta Sondagem demonstra já ter sido enfrentado pelas sociedades de advogados Portuguesas, não obstante as preocupações que todos apontam e o muito que há ainda para fazer.

Conclusão

Todos recolhemos desta Sondagem dados que nos permitem confirmar percepções, intuir tendências, mas também pôr em causa alguns mitos partilhados e difundidos pela generalidade dos Advogados Portugueses. Enunciamos os três que nos parecem mais evidentes:

1. As sociedades de base familiar e, sobretudo aquelas que ainda hoje mantêm uma estrutura societária maioritariamente familiar, são uma realidade que se impôs (ou se adaptou) aos novos tempos, tendo conseguido não apenas sobreviver mas afirmar-se com os seus condicionalismos naturais, mas também com as mais-valias relativas que a natureza especial das suas relações inter-pares potenciam;

2. É ainda manifesto que a realidade societária em geral é composta por estruturas que apesar de devidamente concebidas e dotadas de apoio tecnológico e organizativo (e eventualmente graças a isso) são maioritariamente de uma dimensão pequena; esperamos que esta constatação sensibilize o nosso regulador a propor soluções para problemas que afectam todas as sociedades – como por exemplo o da natureza da relação entre os associados e as sociedades de advogados – sem pré-conceber, por exemplo, que esta realidade se circunscreve às sociedades maiores, propondo um regime que seja aceitável / comportável pela maioria das sociedades de advogados Portuguesas;

3. Finalmente, é com sustentada convicção que podemos afirmar com base nesta Sondagem, que a realidade societária envolve hoje aproximadamente 20% de todos os advogados inscritos na Ordem do Advogados. Na verdade, e pressupondo que os restantes 80% se dedicam todos em full-time à advocacia, esfuma-se a ideia também preconcebida de que os advogados que exercem em sociedades de advogados constituem um número pequeno. O número a que chegamos2 de 4.800 justifica plenamente a representatividade e os fora próprios que entretanto surgiram, casos da ASAP e do Instituto das Sociedades de Advogados (órgão consultivo do Conselho Geral da Ordem dos Advogados), bem como regulamentação especial de que ainda carecem, distinta da Profissão exercida em prática isolada, em campos tão diversos como o regime fiscal aplicável, as regras sobre publicidade e os conflitos de interesses.

Pedro Cardigos, 2010
Presidente do Conselho Director da ASAP – Associação das Sociedades de Portugal
(2008-2010)


1 In “Contributos para as Sociedades de Advogados”, Almedina, 2010, Págs.23 a 37.
2 Número obtido através de um cálculo com os seguintes pressupostos – nas 111 sociedades de advogados que responderam ao inquérito exercem 2.044 advogados. Se admitirmos que nas restantes 933 sociedades de advogados que não responderam exercem em média 3 advogados – ou seja, o número mínimo de dois sócios e um advogado – chegamos a 4.843 advogados. Cfr. artigo de Pedro Siza Vieira, “Conhecer melhor a Profissão” in versão impressa da Advocatus, de Outubro de 2010, pág. 12.

< voltar